Reunidos madrugada adentro,
políticos decidem mais um passo na história brasileira. Não houve assombro com
a decisão proclamada. O povo em seus lares ou já nas ruas a caminho do trabalho
se assombraram ao saber que os políticos, quando querem, também fazem horas
extras.
Depois de um dia inteiro de
proclames e discursos o colégio eleitoral no Senado, comparado pelo escritor
Ruy Castro a um ambiente ginasial pela tamanha demonstração de descompasso
intelectual em suas palavras ou nas dificultosas leituras dos ensaios de
assessores, decidisse pelo afastamento da então Presidente da República. Essa, diga-se
com méritos, outra baluarte no desencontro com a oratória. Se o Senado é um
ambiente ginasial, a Câmara seria um primário com seus alunos mal-educados,
birrentos, cheios de vontade e ignorantes, o que promove maior valor a analogia
feita por Ruy.
O que de fato acontece hoje não é
uma mudança, pois o modelo na prática governamental permanece, com as negociações
de ministérios e a tentativa de abafar os escândalos de corrupção. Tampouco é um
golpe político, já que os elementos existem e o rito processual respeita
ordeiramente o que estipula a constituição. Enquanto os defensores da
presidente alegam a votação popular como garantia legal para se manter no
cargo, esquecendo-se que o vice fora eleito conjuntamente, e que é a eleição o
primeiro requisito necessário para que haja o impedimento, como é requisito
essencial à morte, que tenha havido vida. Os acusadores em sua explanação se
esquecem de suas parcelas de culpa no caos governamental e de gestão, já que
juntos abraçaram o país enquanto os comparsas esvaziavam os cofres públicos.
Não haverá mudança. Infelizmente não
há perspectivas no horizonte. Contudo, com certeza não seria a inércia o
melhor para o momento, pelo simples fato de que esse modelo se apresentou
viciado há uma década, mas nossa benevolência egoísta do agraciado nos impediu
a exigência de mais moralidade e ética na vida política, permitindo a preservação
do gestor que ‘rouba, mas faz’. Desde o escândalo do mensalão o governo vem se
defendendo de acusações e denúncias, não tão investigadas, de corrupção, até
que a operação lava-jato vem à tona e não alivia seu empenho em prol dos
políticos no poder.
De fato, a corrupção parece crônica,
porem o mais devastador é a ilusão desmascarada que destrói o sentimento utópico
de um país mais digno. O país do futuro está temporariamente adiado.
O Partido dos Trabalhadores não destruiu
o Brasil, como também não o inventou como prega em suas propagandas. De fato
devemos valorar as políticas públicas implantadas nos últimos 13 anos, mas não devemos
diminuir a importância das ações de governos anteriores que contribuíram com o cenário
positivo que possibilitaram tais medidas. A política ao fazer arroubos históricos
de autopromoção auxilia na manutenção da ignorância social.
Por vezes se inventa tanto uma
verdade artificial que acabam por acreditar em suas fantasias, talvez seja este
o espelho mais próximo da realidade do partido no poder. Mais do que o livro de
Romeu Tuma Jr., é o próprio PT um assassino de reputações, muitos dos quais membros
de seu quadro partidário. Os dissidentes do partido durante esses anos de
governo criaram partidos em oposição ou com ideias divergentes, correligionários
foram afetados com fracassos eleitorais por ausência de empenho da bancada nas campanhas,
bem como o apadrinhamento político na indicação de candidatos promoveu a desmotivação
de figuras centrais do partido, que debandaram ao não se enxergar na lógica do
poder. Marina na Rede, Heloísa no PSOL, Pinheiro desligado e Suplicy sem
cadeira no congresso, são figuras que mostram o quanto internamente esse
governo não consegue gerir democraticamente a oposição de ideias.
Não se deve, principalmente,
esquecer o nome de Dilma, candidata imposta pelo presidente Lula, até então uma
figura técnica, sem carisma ou conhecimento político para guiar o país. Talvez
seja a questão de sua figura que provoque tanta paixão, para mantê-la ou
destroná-la. Enquanto os governistas a viam como vítima, resultado de sua própria
incompetência, os opositores a viam como negligente, agindo ciente do erro, porém
ambos, contudo, ainda que em seus íntimos, concordam que ela foi extremamente irresponsável
ao não realizar os ajustes necessários para a boa gestão do país, e em seus
discursos desconexos ainda orgulhosamente defendia o absurdo, ‘o brasil estava
bem’ e ‘eram os outros os culpados do caos’. Ela caiu sem entender o que fazia
ali, e acredita que ainda resiste.
Depois de um oligarca latifundiário,
um playboy, um velhinho fanfarrão, um acadêmico boêmio, um aposentado
sindicalista, uma especialista em cargos comissionados, é a vez de um jurista
de penteado lustroso presidir a república democrática do Brasil. Nenhum trabalhador
comum de fato chegará ao poder, pois ainda que o trabalho dignifique, ele não promove
ascensão social, muito menos política. Os bons profissionais no brasil
permanecem em suas profissões, os demais ou perdem a função, ou trilham
caminhos políticos, quando não raro, se tornam políticos sem função.
Nesse samba de roda sem santos,
mas repletos de inocentes, podemos observar que a política nacional reflete de maneira
fiel a sociedade que representa. Uma gama de figuras despreparadas para os
cargos que ocupam, com pouca educação e tolerância, repleta de vícios na busca
por benefícios pessoais, arrogantes e orgulhosos que ao serem descobertos em
seus erros vestem os seus mantos e se ‘vitimizam’, sendo sempre ameaçados pelos
mais poderosos e sofrendo das fatalidades da vida. Nunca somos responsáveis por
nossas mazelas. A constituição cidadã nos garantiu diversos direitos,
esquecendo-se de valorar os deveres de cada um para com seu povo e seu país.
Dessa forma seguimos em frente.
Aos atuais 11 milhões de desempregados
somamos agora o ex-senador Delcídio, cassado por decoro ao atuar atrapalhando a
justiça nas investigações, e os presidentes impedidos, Dilma e Cunha, que
receberam seus avisos prévios. Se política for emprego, aparentemente está perdendo
a estabilidade, se for função social, ainda temos milhares a cassar nos estados
e municípios do país, sem esquecer os nobres suspeitos de Brasília.
Fica evidente a necessidade de se
reinventar a nação, mas uma reforma política realizada por estes políticos não nos
instiga credibilidade. Devemos qualificar essa democracia que é acessível, mas não
exige o mínimo de conhecimento, para não ser prolixo na questão da ética e da
moralidade.
O Senador Cristovam Buarque no
ano de 1999 em seu manifesto-proposta para a erradicação da pobreza no Brasil,
intitulado A Segunda Abolição, onde ele apresentou proposta que vieram a ser o ‘Bolsa-escola’,
o ‘Minha casa, Minha vida’ e as ‘Escolas Técnicas’, defendia uma coalizão partidária
para uma revolução social. Em suas palavras, ‘’uma coalizão que se fará por
razões éticas, e não por razões políticas’’, já evidenciava que política e ética
dificilmente andam de mãos dadas em nossa pátria.
Enfim, assim chegamos a essa data
sem nada a comemorar.
Amanhã é 13 de maio, e como canta
Caetano, "dia 13 de maio em Santo Amaro na praça do mercado os pretos
celebravam, talvez hoje inda o façam, o fim da escravidão, da escravidão, da escravidão...’’
talvez um dia, quem sabe, possamos celebrar o fim da ignorância cultural,
social e política, e assim termos de fato uma pátria educadora que transforme
as massas de analfabetos funcionais em cidadãos dignos com uma vida mais justa,
num país mais sério. Uma verdadeira revolução nessa democracia fajuta que nos
torna refém de um país miserável.
Uma segunda abolição que nos liberte a mente
e a alma.