29 de abril de 2009

Crônicas de eLe - XIX

DESGOSTO
Diante de uma representação tão genuinamente verdadeira do amor na sua essência juvenil da irracionalidade e realização que preenche a alma e se resguarda no abstrato poço cardíaco, apenas um personagem não parece satisfeito. Seus motivos são claros, mas não morais.
Aquele que não se alegra com a onda calorosa de felicidade que os jovens irradiam é o pai da moça. O homem sabe que seu pensamento não é correto, mas age assim por impulso ou por omissão de seu caráter que nunca funcionou por caprichos do sentimento. O pai e o patrão de eLe eram a mesma pessoa, o seu Arnaldo , dado que o garoto não conhecia.
Percebendo os comentários dos outros empregados, seu Arnaldo estava muito insatisfeito com tal relacionamento, e seu pensamento não se conformava.
*
¬Como poderia sua filhinha, bem criada, conhecedora do mundo e dos caprichos de sua classe social se permitir um elo com um rapaz de posição inferior. Apesar de sua beleza exótica e seu caráter até então inquestionável, eLe é um empacotador ‘sem condições’ ao lado de uma princesa que sempre realizou as suas vontades. Seria essa mais uma vontade dela, enfrentar seus pais por meio de um namoro indesejado?
*
Sem ter convicção de que atitude deveria tomar, levando em conta o comportamento tão correto que o rapaz apresentava no trabalho, além é claro do episodio em que se conheceram, deixou que as coisas corressem naturalmente. Na verdade ele imaginava que aquele interesse da menina acabasse logo, como acontecia com seus presentes, como um desejo fútil e passageiro.
...
Enquanto isso os enamorados continuavam se amando como se cada dia fosse o último, sem saber que este se aproximava

26 de abril de 2009

Então sejamos

"Diante de coisa tão doída, conservemos-nos serenos. Cada minuto de vida nunca é mais, é sempre menos."*
*Cassiano Ricardo
Quanto é preciso para se perceber que o que se perde é justamente o que não se quer guardar. O coração nos ensina mil e uma modalidades de sentir. Umas, gostaríamos que durassem a vida inteira e na maioria das vezes não duram segundos, enquanto outras que preferiríamos não experimentar passam semanas nos corroendo. Viver é a ardilosa arte de fechar os olhos e andar atento.
Ontem me passaram alguns segundos de exposição daquilo que eu deveria assistir com cautela. Imagine-se um crítico de arte julgando obras num concurso, você avalia ao seu modo quem teve mais qualidade no trabalho, mas no fim pouco importa quem ganhou. A arte é algo que se revela ao olhar do encanto. Cada um vê seu mundo como quer. Então voltando ao assunto tempo, tenho agora a certeza de que minhas ações, corretas ou não, não dizem respeito aos meus princípios, nem meus costumes, elas apenas refletem meus desejos efêmeros. Amanhã eu vou me arrepender por não ter feito ou por ter, mas desde que eu tenha sido feliz ontem já valeu. O triste disso tudo é que no futuro a gente sempre projeta o passado, e fica se martirizando ao invés de conquistar nossas migalhas de alegria. Entender que na velhice todo mundo se torna sábio facilitaria a burrice juvenil.
Bom, cansei de tentar expor algo que nem eu sei o que quer dizer.
Mas resumindo: Temos pouco tempo para sermos nós. Então sejamos.

25 de abril de 2009

Crônicas de eLe - XVIII

NOVAS NOITES, NOVOS DIAS
Aquela noite fora a melhor coisa não imaginada que poderia lhe ocorrer. eLe, ainda flutuante, retornava ao seu lar com um sorriso bobo na face. Já se passava das vinte e uma horas e o tio preocupado sem notícias do mancebo apaixonado o aguardava na sala de estar. Invadindo seu lar foi logo explicando o que ocorrera, nem deu ouvidos aos conselhos e sermões de seu tutor.
O menino tinha a felicidade estampada nos olhos, e isto lhe impedia de ver qualquer outra coisa que não fosse a imagem encantadora de sua amada. A doce Eugênia não tinha idéia do que ocorria com eLe, mas o mesmo queria acreditar que onde estivesse ela, estaria vivendo a mesma sensação de euforia incontida.
Banho e cama. Deitado ainda saboreava as lembranças do encontro mágico. Aos poucos foi se permitindo encontrar o sono, mas não se desfez em nenhum momento daquele sorriso fácil que lhe escapava dos lábios – a prova do crime de seu estado de amor.
...

Os dias se passaram e em todos eles algo novo se imprimia eterno, a presença da menina de mãos de orvalho. Os dias no trabalho eram intermináveis na espera para que logo estivessem juntos, e ao fim de cada dia um novo cenário urbano era descoberto.
Já não se fazia segredos aos colegas e amigos, a rua estava cheia daquele amor juvenil. Ruas, becos, pontes e muros incontáveis já sabiam de seus sentimentos. Na flor da mocidade o amor tende a ser uma coisa de exposição absurda. Nem os astros do céu podiam fingir não saber.
E tudo rumava agora lentamente para que ao máximo pudessem apreciar seus momentos. O mundo, agora confortável e leve, era um pomar exótico para as observações do menino do sol. Havia encontrado seu paraíso.
Mas para tudo na vida existe um porém.

Crônicas de eLe - XVII

OS LÁBIOS
Caminhavam a qualquer lugar na noite que os abraçava sutilmente. Falavam sobre suas vidas, do que gostavam. eLe descobrira que a menina ainda estudava o colegial, que gostava de voleibol e que viajava sempre para o sul do país para casa de parentes. Ela por sua vez, descobriu que eLe era nordestino, já havia se formado no ensino colegial, tinha pretensões de cursa uma faculdade, mas ainda não sabia em que, e que tinha ido até o seu mundo em busca de novas perspectivas.
Eram dois personagens típicos de um romance inviável, locais, culturas e visões distintas do mesmo ambiente. Aos poucos as vontades daqueles extremos iam convergindo ao mesmo pensamento. Já estava ficando mais tarde do que deveriam permanecer na rua, estavam em um parque da cidade e ela teve que se despedir. Caminhavam ao ponto de taxi quando eLe inesperadamente deixou escapar uma indagação:
...
- Por que motivos estamos aqui neste pedaço de mundo, juntos, se somos tão diferentes? – eLe instantaneamente se repreendeu por ter feito tal pergunta.
...
Ela demorou-se o observando encabulado, e após ter certeza do que deveria dizer, o olhou diretamente, foi se aproximando de sua face, encostou seu rosto no dele como um gato carente a procura de carinho, deslizando sua bochecha na dele. Aos poucos seus lábios foram se aproximando daquela boca surpresa e ansiosa. Ali, unidos delicadamente, os lábios estavam vivendo a efêmera confirmação da felicidade.
Então se afastando ela respondeu:
...
- Porque eu gostei de você.
...
Eugênia correu para o taxi mais próximo enquanto ele olhava encantado sem entender o que havia acontecido. E quando taxi já começava a se mover ela com parte do corpo para fora, sorriu e bradou:
...
- E queria muito te beijar!
...
Bobo, eLe se encaminhou para o ponto de ônibus urbano. Olhava para as edificações a sua volta e não conseguia definir suas cores. Estava delirando em meio a um arco-íris particular.
E ainda existem aqueles que buscam resolver a equação do coração, mesmo sabendo que para isso não existe lógica.
...

22 de abril de 2009

Boa Sorte, TERRA!

Do ventre de um tempo perdido surgiu o berço de nossa existência, este canto querido que nos foi ofertado pelos deuses do ego e ao qual não é dado o devido valor. O planeta que não é nosso - e ainda assim insistimos em determinar limites e proprietários.
Mudamos os cursos da história através de ações impensadas e limitadas ao nosso olhar sob esta viseira de burro humanóide. Pobres seres estes capazes de se pensar superiores, não vêem o passo seguinte, não vêem abismo que se aproxima do aconchego de seu lar. Aquela velha premissa bíblica do fim do mundo é uma triste inverdade, o mundo não vai acabar. Não sozinho. Nós acabaremos com ele. Quando vejo os outros habitantes em suas ações, o meu peito se enche de vergonha. Como posso eu, ser pensante, devastar algo tão precioso como meu espaço no universo, meu aconchego vital. Seriam os humanos uma espécie de vírus como os filmes hollywoodianos insinuam ser? Infelizmente essa é a analogia mais próxima que podemos criar.
Haverá um dia em que minhas palavras nada significarão. Os sobreviventes não terão acesso a nossa língua, não saberão identificar sinais, serão outros grupos de vida, de seres. E espero que ao menos tenham a capacidade de entender que importante não é evoluir em busca de poder, pois não existe poder maior do que a condição da vida. Os vivos determinam seu caminhar, o resto é adubo orgânico.
Fico me perguntando o que posso fazer para ajudar o planeta, e infelizmente percebo que nada seria tão importante como minha morte, assim deixaria de consumir os recursos, e destruir o ambiente. Qualquer outra ação serviria apenas para amenizar o estrago causado. A solução então seria o suicídio, mas meu ego não me permite. Então planeta Terra me desculpe por assistir tudo de camarote.
Numa película ouvi a seguinte afirmação: “se o planeta morrer, o homem morre com ele. Mas se o homem morrer, o planeta viverá plenamente.” Então que seja assim, que meus netos sejam mais inteligentes, menos egoístas. E ao Planeta: -Boa Sorte!

18 de abril de 2009

Vício da Rotina

O que é a morte?
.
Meu pai chega cedo do trabalho, - algo estranho –
deita no tapete, toma seu café, vai pro banho,
depois ainda assiste a novela, diz que ela
não merecia sofrer tanto.
- Eu me espanto.
.
Minha mãe já deitada no sofá, não se agüenta,
olha a cena com revolta, fala alto e tenta
ajudar a mocinha da história a fugir.
Chora, mexe, bufa e ri.
- Eu não rio.
.
Meu irmão da escola vem suado, se esparrama
no sofá, que não é cama, é uma bagunça.
Olha a tevê com um olhar de esperança
e, ele cansa enquanto torce.
- Eu não torço.
.
Meu pescoço já parece entendido,
passa o dia acomodado e bem vivido.
Vou à rua só para espiar, mas volto logo
para esperar o meu programa que é outro.
Vivo pouco.

14 de abril de 2009

Eu e a chuva

...e quando você me viu correndo na rua em meio aquele temporal absurdo, não fazia idéia de quanta adrenalina corria em minhas veias, nem tinha noção de como a felicidade é uma explosão incontrólavel de sensações, e nem imagina como pode ser tão bom parecer tão bobo. Era eu um moleque descontrolado e o lado de fora do mundo era meu parque de diversão. Sorria indiscriminadamente da cara dessa gente que se esconde da chuva na marquise dos prédios sem cores, que se revela na brechas das janelas com medo de ser feliz. Fui...
Louco o mundo me viu e eu nem aí, nem de cá... O que me interessa tá na risada gostosa que a alma me abre no peito, a sensação de euforia que responde aos meus anseios juvenis que ão de me acompanhar por toda essa breve vida, intensa e alucinada. E os trovões e clarões eram parte daquela canção de amor.
Estava completo no teto de uma paixão solitária.
.
.
.
leia escutando
love song
Sara Bareilles

13 de abril de 2009

Monumento Feminino

Ela me olha de cima de sua altura,
um monumento feminino
de sorriso manso e avassalador.
O corpo desfila ao meu olhar
me impregnando um desejo
maior que a timidez.
Já não sou eu quem te admira,
é cada parte da gênese
que me compõe,
cada célula que se faz vida.
Ao meu sussurro secreto
que o vento te leva sutilmente
sibila a ânsia de um novo encontro.
É um momento,
um louvor ao tempo,
um cantar da alma.
Quando os olhos falam
o mundo cala,
e o que se ouve é o meu querer.
... e sonho com a árvore do pecado.

10 de abril de 2009

O Homem

Tem pessoas no mundo que tem atitudes bem especificas quanto ao legado que vai deixar e a importância de seu exemplo. Todos nós deveríamos agir desta maneira, mas quando pensamos na vida nos tornamos ilhas egoístas que não acreditam na existência de um continente povoado. A realeza estomacal nos impede de observar o bem que podemos fazer aos outros se deixarmos de lado pequenos pensamentos tolos de benefício próprio. Não estou falando de fazer caridade, apenas de fazer o correto. Se você fizer sua parte sem afetar as chances do outro, não lhe tirando nenhum direito, nenhuma vantagem, vivendo sua vida honestamente e com dignidade, já é o suficiente para influir positivamente no seio da sociedade.
Quero eu um dia olhar minhas crias com orgulho e certeza de que fiz o melhor para educá-las, e não estou falando de boas escolas, nem de professoras capacitadas. Estou falando de caráter. E disso eu sou o responsável. Somos os exemplos daquilo que vivemos. E acreditem cada passo dado é um incentivo a quem nos admira, então caminhe pelos lugares certos.
Não sou homem de riquezas financeiras, nem de posses. Meu pai me deu cultura e educação, me deu amor e um lar tranqüilo e feliz para viver. E me deu um exemplo que não posso esquecer. Ele é um baixinho barrigudo sem diplomas que fez de tudo para que o mundo a sua volta fosse um pouco melhor. A minha altura física não chega a uma parcela do tamanho do seu caráter. Eu o amo e o admiro. Um dia hei de ser um Homem, assim como meu pai.

Súbita Vontade

Olho o tempo distante em meus anseios particulares, quando o peito clama por um calor que não se faz presente. É o agora. O efêmero do desejo carnal. A vontade do toque. Assisto cenas que penetram minha alma quando os olhos fecham com intenção de encontrá-la.
Ela que já não é um ser personalizado, uma figura que não tem a face imaginada, poderia ser você ou outra que se sinta capaz de desejar e possuir o que se pode e o que se quer. Não haveria contratos sociais em nosso enlace, já que o mesmo no máximo durasse a intensidade da loucura e da libido. Seriamos pares que se encontram para saciar e rebater a ausência de um amor. Talvez fossem somente palavras que sairiam de nossas bocas rumo aos ouvidos solitários e carentes de belas sinfonias. Talvez uns versos, talvez risadas, ou até mesmo zumbidos que no silêncio do olhar se faz em graça. O desejo da materialização do outro é um tanto quanto um sopro de vida nesse coração congelado e medroso, um sinal de que a vida ainda me é uma realidade.
Quando a noite me tomou em seu colo, eu me vi sonhado com teus lábios. Era eu ali no tapete da sala que vivia o vazio sentimento. Tem dias que eu só queria poder beijar na boca.

5 de abril de 2009

Crônicas de eLe - XVI

O NOME DO SONHO
O fim do serviço se aproximava e a pressa em seu coração ganhava novos ritmos que atravessavam a harmonia do tic-tac. O relógio gigante no alto da parede no centro do mercado era um outdoor permanente, o digital no braço de eLe parecia mais pesado pela angústia do reencontro. Havia uma magia percorrendo o ambiente. Até o crepúsculo que se anunciava próximo pelas portas de vidro empolgavam o olhar apaixonado do menino que acabara de chegar a sua festa surpresa.
Chega o horário encantado e eLe parte desesperado para a saída sul. Seu coração palpitando mais forte a cada passo naquela direção. Mas no meio do caminho algo atravessa seu pensamento.
...*o que vou dizer a ela? o que posso oferece-la?
será que ela ainda estará lá?*...
Chega no local marcado com os batimentos cardíacos em estado normal; olha ao redor e não encontra ninguém. Era apenas mais uma ilusão acreditar que aquele bela menina estaria dando chances a um zé qualquer. A cabeça se abaixa com um a de um perdedor envergonhado de seu próprio sonho.
Duas mãos se põem sobre seu olhar. Mãos macias, cheirando a orvalho, dá até pra sentir a respiração leve que encosta a nuca. Ele se arrepia e aproveita aquele momento sem saber ao certo quem possa ser. Então aos poucos a noite vai nascer iluminada.
...
- Quem é?
- Sou eu, Eugênia!
- Quem!?
...
Ela desvenda seu olhar e apresenta a face e o nome, significativamente são pares. Peças complementares do mesmo ser divinal. A nobreza da beleza ingênua e o doce da humildade real. Era a menina de seus sonhos. eLe parado ficou por uns segundos apenas admirando sua face tão perto. Ela corou e calou-se, esperava alguma palavra. Então foi preciso acordar para a realidade e se expressar. eLe não pensou, apenas disse:
...
- Oi!... Você é linda!
- Obrigada! - Ela ficou ainda mais vermelha -Você pretende ficar me olhando ou podemos ir a algum lugar?
- Oh, me desculpe! É... Onde podemos ir?
- Não sei. Hoje não tenho pressa de voltar pra casa. Estou à deriva, e o leme está sob seu controle.
...
Ali começava a mais fantástica viagem que ele poderia imaginar no novo mundo. Rumava ao desconhecido mar do amor. Era um tripulante de primeira viagem e a sua companheira lhe deu o mapa do tesouro. Foi sem medo.
Na vida é preciso mergulhar.

4 de abril de 2009

a Bailarina e o Palhaço

Fim do espetáculo. Todos saem satisfeitos da arena caminhando ao portão no sentido inverso da alegria. Lá, atrás do picadeiro e da cortina vermelha imensa, uma caça acontece enloucubrada. O palhaço corre em busca do sorriso de uma bailarina que se esquiva de suas tentativas de amasso.
Ele sem espaço que comporte seu desejo busca o beijo do completo amor inteiro. Cada pedaço do seu peito luminoso é um assombroso ateliê de gravuras românticas, cenas eternizadas daquela paixão incontrolável. Entre um sorriso gasto e um salto leve, a perseguição segue rumo à noite iluminada de néon e purpurina, luzes vivas em um circo sem mentiras. Ela baila entre os leões e os elefantes, brinca linda em trampolins, deita bela na caixa mágica. Mas sobre a rede elástica eles se encontram em soma, em multiplicação de sentimentos, em experimentação de sentidos.
O palhaço, bobo e vivo, cheio da fantasia da aurora faz poesia em seu umbigo e com suas mãos cria histórias. A bailarina, leve e divina, trança seus pés no ar e cora, faz-se menina do sonho eterno enquanto a música se evapora. Os dois são mil e uma vezes o amor que nos encanta: um menino amarelo, uma magra e doce dama, olhar singelo, saltar em elegância; são o breve encontro do sorriso com a dança.
E quando o sol assume sua altura devida, a sapatilha no chão e o pé descalço buscam-se lentamente. Um sorriso borrado nos rostos de ambos os apaixonados se revela. Faz-se a aquarela circense do amor.